Subfaturamento e subvaloração no comércio exterior brasileiro: Algumas considerações conceituais – Cláudio Augusto Gonçalves Pereira (desde Brasil)

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i. Introdução.

O presente artigo tem como objetivo apresentar, ainda que de forma breve, algumas considerações acerca das diferenças existentes entre o subfaturamento e a subvaloração no comércio exterior. Isto porque, pelas regras prescritas no artigo 76 do Regulamento Aduaneiro brasileiro, toda mercadoria submetida a despacho de importação estará sujeita ao controle do correspondente valor aduaneiro; vale dizer, basta que a autoridade fiscal tenha alguma suspeita de irregularidade na valoração do produto importado ou na fatura comercial apresentada pelo importador para que seja dado ao início ao procedimento de controle aduaneiro mais específico. Referida fiscalização, portanto, deverá percorrer os trilhos da legalidade e não o caminho oposto.

Pela prática diária, contudo, é perceptível que as autoridades aduaneiras brasileiras têm inovado no enfrentamento do tema justamente por desconhecerem os conceitos e as diferenças entre os dois institutos.

Portanto, sem a pretensão de esgotar o tema aqui proposto, o presente escrito será desenvolvido pela análise dos dispositivos legais que regulamentam a valoração aduaneira, a conceituação da subvaloração e do subfaturamento pela doutrina e alguns julgados administrativos para, ao final e ao cabo, contribuir com o aperfeiçoamento dos estudos dos direitos aduaneiro.

ii. Conceito de subfaturamento e de subvaloração.

Os tributos incidentes sobre as operações de comércio exterior encerram um relevante papel regulatório ou extrafiscal ao lado da função arrecadatória ou fiscal a eles inerentes. Por intermédio do aumento ou da redução desses tributos, tem-se como controlar a demanda interna de determinados produtos, de modo a incentivar a indústria nacional ou reprimir eventual pressão inflacionária, entre outras finalidades possíveis dentro das políticas econômicas e internacionais de cada Estado.

Dito de outro modo: os tributos fiscais se constituem como fonte de arrecadação para os entes políticos quando instituídos para atender às necessidades orçamentárias da Administração Direta, ao passo que os tributos extrafiscais são aqueles em que a função arrecadatória é sobreposta pela inibição ou indução de comportamento do contribuinte.

Dentro desse contexto, é de clareza solar a importância da adequada valoração aduaneira das mercadorias e da previsão, na legislação tributária, de mecanismos capazes de garantir a fiscalização e a repressão da manipulação artificial de preços, sobretudo os praticados entre partes relacionadas.[1]

No ordenamento jurídico brasileiro, a valoração aduaneira é regulamentada pelo Decreto n° 6.759/2009, que consolida a aplicação das regras do Artigo VII do Acordo Geral de Tarifas e Comércio – Gatt (Anexo 1-A – Acordo de Valoração Aduaneira – AVA – da Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais), aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30/1994 e promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994.

As regras de valoração aduaneira do AVA/Gatt compreendem um critério base, incidente na grande maioria das operações (método do valor da transação), e cinco critérios substitutivos, que são aplicados sucessivamente e em caráter excludente: o método do valor da transação de mercadorias idênticas; o do valor de transação de mercadorias similares; o do valor de revenda ou do valor dedutivo do custo de produção ou do valor computado; e o método do último recurso, também denominado critério da razoabilidade.[2]

Importante destacar aqui que a utilização dos métodos de valoração aduaneira será feita de acordo com o que dispõe a introdução geral do AVA, pelo qual se infere a determinação de que o primeiro método que deverá ser aplicado é o do valor da transação.[3]

De acordo com o método do valor da transação, o valor aduaneiro – base de cálculo dos tributos aduaneiros – deve corresponder ao preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, ajustado nos moldes do art. 8º do AVA/Gatt e os artigos 77 e ss. do Decreto-lei nº 37/1966.

A autoridade fiscalizadora, contudo, pode discordar do preço declarado na Declaração de Importação (DI), fundamentando a discrepância no valor das mercadorias idênticas ou similares em operações envolvendo compradores não vinculados situados no mesmo país de destino (art. 2°, “a” e “b” do AVA/Gatt).

Vale dizer: caberá à autoridade aduaneira indicar, de forma clara e fundamentada, os motivos que o levaram a não utilizar determinado método, bem como explicar a opção pelo método subsequente.

Após a manifestação do importador, caso não seja demonstrada a aceitabilidade do valor declarado, devem ser aplicados um dos métodos substitutivos, com exigência da diferença do crédito tributário acrescida de juros de mora e, em caso de lançamento de ofício, de multa de 75% (Lei nº 9.430/1996, art. 42, I).

É nessa inter-relação de circunstâncias que se opera o conceito de subvaloração, que nada mais é do que a aplicação indevida de um dos métodos de valoração aduaneira pelo importador, sem a ocorrência de fraude de valor.

Nos casos de fraude de valor, por conseguinte, não há subvaloração, mas subfaturamento, que se diferencia da primeira justamente em razão da ilicitude da conduta praticada pelo importador. Essa é a lição do professor Rodrigo Mineiro Fernandes ao prelecionar que:

É importante, mais uma vez, separar as operações lícitas das operações ilícitas para conceituarmos o subfaturamento, diferenciando-o de outra prática aparentemente similar: a subvaloração. Esta, uma irregularidade dentro do campo da licitude. Aquela, através da prática de um ato ilícito. O subfaturamento é realizado mediante o registro da Declaração de Importação com declaração de preço inferior ao efetivamente praticado, com base numa fatura comercial falsa (ideológica ou material).[4]

Portanto, o subfaturamento ocorre quando o importador registra a declaração de importação (DI) tendo por base uma fatura comercial que não reflete o preço realmente pago pelo produto importado. Essa discrepância pode resultar da falsificação da fatura, mediante apresentação de versão não verdadeira substitutiva da fatura genuína ou por adulteração do documento verdadeiro (falsidade material). Também pode ocorrer quando, mediante conluio entre importador ou exportador, emite-se uma fatura verdadeira, porém, com valores menores que os efetivamente praticados (falsidade ideológica).

Primeira conclusão: o subfaturamento insere-se no campo das infrações aduaneiras marcadas pelo ilícito, justamente por ser ato praticado pelas partes declarantes mediante a falsidade (material ou ideológica) da fatura comercial, consistente na apresentação às autoridades aduaneiras de declaração falsa de valor do preço pago ou a pagar do produto importado, tendente à redução ilegal da base de cálculo dos tributos aduaneiros enquanto a subvaloração nada mais é do que a aplicação indevida de um dos métodos de valoração aduaneira pelo importador, sem a ocorrência de fraude de valor (Opinião Consultiva n 10.1, do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira[5]), isto é, não há falsidade do valor declarado mas, sim, divergências de interpretação na aplicação das regras contidas no Acordo de Valoração Aduaneira (AVA) entre o operador econômico e as autoridades aduaneiras.

iii. Necessidade de prova da falsidade: material e ideológica.

Consabido que é a fatura comercial é documento obrigatório para o processamento do despacho aduaneiro de importação, pois nele são informados os dados do importador, da mercadoria, do país de origem, de aquisição, de procedência, do preço, das condições de venda, de pagamento, da moeda e etc (artigo 557 do Decreto 6.759/2009); isto é, documento indispensável à regularidade e à legalidade ao ato de importar e ao ato de fiscalizar.

É dizer: os operadores econômicos devem apresentar todas as informações relevantes perante a unidade aduaneira para que ela possa fiscalizar de maneira adequada os ingressos e saídas de mercadorias no território nacional.

Entretanto, há situações em que a fatura comercial apresentada perante a Aduana poderá sofrer algum tipo de falsificação por ato dos próprios agentes econômicos. Nesse sentido, a verificação da falsificação ou da adulteração da fatura comercial é de extrema importância porque, uma vez comprovado o falso, haverá impacto direto acerca do tipo de consequência jurídica a ser imposta ao operador econômico.

Em sede de valoração aduaneira, os atos de sonegação e de fraude são recorrentemente praticados por intermédio da falsificação da fatura comercial, seja ela material ou ideológica; quanto a isso não reside nenhuma dúvida. Logo, a falsidade é pressuposto lógico do subfaturamento.[6]

Solon Sehn, ao discorrer sobre tema, ensina:

Trata-se de delito associado à chamada fraude de valor, também denominado subfaturamento. Neste, as partes, mediante falsificação dos documentos de instrução da declaração de importação (DI), declaram um valor aduaneiro diverso do efetivamente pago ou a pagar pelo produto importado, visando à redução indevida da base de cálculo dos tributos aduaneiros. O subfaturamento, assim, pressupõe a falsidade material ou ideológica. Não resulta da simples constatação de que a venda se deu por preço reduzido ou abaixo do preço de custo. Tampouco se mostra sinônimo de subvaloração, que constitui a redução da base de cálculo decorrente de aplicação equivocada dos métodos de valoração aduaneira, de boa-fé, sem a apresentação de declarações e documentos inverídicos ou inexatos.[7]

Sendo assim, a prova do delito da falsidade material passa necessariamente pela investigação direta da fatura comercial; vale dizer, submissão à prova técnica pericial capaz de avaliar, indicar e atestar a falsidade ou a adulteração do documento, ao passo que a prova do delito da falsidade ideológica caminha pela comprovação de que o preço pago pela mercadoria importada foi diferente daquele constante na fatura comercial.

Logo, na falsidade material se busca a mácula existente nos requisitos formais ou materiais da fatura comercial através de prova técnica pericial enquanto na falsidade ideológica se pretende alcançar o preço efetivamente praticado na operação comercial por qualquer meio lícito de prova.

Digna de reprodução é a importante passagem contida no Voto do Conselheiro Paulo Roberto Duarte Moreira (Acórdão n. 3201-005.482, de 19.06.2019) acerca da prova do subfaturamento, colhe-se:

A autoridade fiscal não logrou êxito em demonstrar que material ou ideologicamente alguma fatura comercial fora emitida com qualquer falsidade na declaração dos preços das mercadorias importadas.

Ao contrário, o fundamento constituiu-se em meros indícios de preços inferiores ao comparar com outras importações, sem levar em consideração a natureza da operação comercial e possíveis variações no estado ou características diferenciadoras dos equipamentos ainda de mesmo modelo e ano de fabricação. Ademais, não há qualquer elemento que objetivamente demonstra que o vínculo entre exportador e importador influenciou o preço.

(…).

A prova do subfaturamento de preço não é a diferença de valor de uma mesma mercadoria obtida em diferentes importações, que sequer demonstrou apta a ser comparada sem qualquer avaliação ou análise de suas características ou particularidades. A diferença de preço é apenas o ponto de partida para aprofundamento da análise de provável subfaturamento, que juntamente com outros elementos podem resultar um conjunto probatório robusto e suficiente a comprovar a fraude; daí porque é de se falar que se trata de mero indício.

Segunda conclusão: somente haverá infração aduaneira – subfaturamento – quando a autoridade aduaneira provar a falsidade; sendo ela material ou ideológica, caso contrário, não.

iv.  Certeza do subfaturamento.

Comprovada a falsidade da fatura comercial no curso do despacho aduaneiro ou em procedimento de revisão aduaneira, a autoridade fiscalizadora deverá afastar imediatamente os métodos do Acordo de Valoração Aduaneira – AVA – e apurar o crédito tributário nos termos do artigo 88 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, colhe-se prescrição normativa:

Art. 88.  No caso de fraude, sonegação ou conluio, em que não seja possível a apuração do preço efetivamente praticado na importação, a base de cálculo dos tributos e demais direitos incidentes será determinada mediante arbitramento do preço da mercadoria, em conformidade com um dos seguintes critérios, observada a ordem seqüencial:

I – preço de exportação para o País, de mercadoria idêntica ou similar;

II – preço no mercado internacional, apurado:

a) em cotação de bolsa de mercadoria ou em publicação especializada;

b) de acordo com o método previsto no Artigo 7 do Acordo para Implementação do Artigo VII do GATT/1994, aprovado pelo Decreto Legislativo no 30, de 15 de dezembro de 1994, e promulgado pelo Decreto no 1.355, de 30 de dezembro de 1994, observados os dados disponíveis e o princípio da razoabilidade; ou

c) mediante laudo expedido por entidade ou técnico especializado.

Parágrafo único.  Aplica-se a multa administrativa de cem por cento sobre a diferença entre o preço declarado e o preço efetivamente praticado na importação ou entre o preço declarado e o preço arbitrado, sem prejuízo da exigência dos impostos, da multa de ofício prevista no art. 44 da Lei no 9.430, de 1996, e dos acréscimos legais cabíveis.

Nesse sentido, duas são as hipóteses previstas na normativa acima citada para determinar a base de cálculo dos tributos e demais direitos incidentes. A primeira delas ordena que a base de cálculo deva ser o preço efetivamente praticado quando ele for conhecido pela autoridade aduaneira, já a segunda, estabelece o arbitramento do preço pelos critérios indicados em ordem sequencial dos incisos, vale dizer, aplica-se a norma prescrita no caput da Medida Provisória quando conhecido o preço efetivado na operação de importação, ao passo que sendo ele desconhecido, aplicam-se os incisos sequencialmente.

Ao analisar essa questão, merece destaque a pertinente observação feita por Solon Sehn acerca da possibilidade de haver nulidade – por vício material – no auto de infração lavrado mediante arbitramento na falsidade ideológica.[8] Em suas palavras:

Na falsidade ideológica, não cabe o arbitramento previsto no art. 88 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, por absoluta falta de interesse, já que a caracterização da infração resulta da própria demonstração da discrepância entre o valor declarado e o preço real. Logo, se a autoridade fazendária conhece o preço efetivamente praticado na importação, deve adotá-lo como base de cálculo para a exigência da diferença do crédito tributário, sob pena de nulidade do auto de infração por vício material. O arbitramento tem lugar apenas na falsidade material, salvo se a autoridade fazendária, além de constatar a falsificação da fatura, tiver como determinar o preço real praticado na operação. Isso ocorre quando o importador – sem  conluio ou mesmo aquiescência do exportador – promove a adulteração da fatura emitida por este, registrando na declaração de importação um preço que não corresponde à realidade.

Terceira conclusão: no subfaturamento, o crédito tributário deve ser apurado de acordo com o artigo 88 da Medida Provisória nº 2.158-35/2001, ressalvado o não cabimento de arbitramento na hipótese de falsidade ideológica.

v. Dúvida razoável: hipótese de subvaloração.

Fiel ao entendimento contido no Acórdão n. 3101-00.468 do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF -, é de se concordar que, nos casos de dúvida:

a autoridade aduaneira deve fundamentar o ato administrativo fiscal, demonstrando a existência de dúvida a partir de dados objetivos. Se esta não se mostrar justificada ou basear-se em critérios fictícios, arbitrários ou subjetivos, o lançamento tributário será nulo, por vício material, em decorrência da inversão indevida dos métodos de valoração aduaneira”.

Isto implica em dizer que a dúvida, por parte da autoridade aduaneira, devidamente justificada ou baseada em critérios reais, legais e objetivos é elemento determinante para o afastamento do método do valor da transação. Logo, a apuração do crédito tributário deverá ser alcançada mediante aplicação de um dos métodos sucessivos previstos no Acordo de Valoração Aduaneira – AVA.

Nesse sentido, não foi outro o entendimento do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira – CTVA – que também concluiu pelo afastamento da aplicação do primeiro método de valoração na hipótese de haver dúvida acerca da veracidade dos documentos apresentados pelo importador.

No Estudo de Caso n. 13.1 do referido Comitê, a administração aduaneira afastou o art. 1, aplicando o método substitutivo do art. 2, porque havia dúvidas razoáveis sobre a veracidade ou exatidão do valor declarado, consistentes nos seguintes fatos: “(i) o importador não forneceu nenhuma evidência, além da fatura comercial, para comprovar que o valor declarado representava o preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, ajustado de acordo com o Artigo 8; e (ii) os registros da contabilidade durante a auditoria revelaram uma despesa questionável, a administração aduaneira, por conseguinte, concluiu que ainda restavam dúvidas razoáveis sobre a veracidade ou exatidão do valor declarado e notificou o importador os motivos para tal conclusão”. [9]

Portanto, é correto afirmar que a autoridade aduaneira deverá aplicar o método do valor da transação quando estiverem presentes os elementos de segurança confirmatórios da autenticidade de qualquer informação, documento ou declaração apresentado para fins de valoração aduaneira.

Quarta conclusão: somente será possível o afastamento do método do valor da transação pela aplicação do método substitutivo consequente quando houver dúvida razoável do agente aduaneiro fiscalizador.

vi. Crítica ao sistema aduaneiro infracional brasileiro.

O controle aduaneiro está estruturado a partir de premissas fundamentais que podem penalizar severamente o importador ou exportador de mercadorias. Isto porque, no Brasil, constitui-se infração aduaneira toda ação ou omissão que importe inobservância, por parte da pessoa física ou jurídica, de norma estabelecida ou disciplinada no Decreto nº 6.759/2009 ou em ato administrativo de caráter normativo a complementa-lo.

Nesse passo, é cristalino que a natureza das infrações aduaneiras tem seu fundamento de validade na unidade do sistema jurídico ao revelar que os comportamentos ativos ou comissivos, voluntários ou não, que, ao final, contrariem ou não observem os parâmetros legais serão considerados como atos infracionais.

Portanto, dentro dessa lógica, basta haver violação de normas, por ação ou omissão, para que seja caracterizada a infração.

A crítica que aqui se faz é clara: ao analisar as questões aduaneiras sob a perspectiva da responsabilidade objetiva, ao nosso pensar, ocorrerá inevitavelmente uma afronta direta ao próprio núcleo das infrações que é justamente a conduta humana, pois é com base nela que se constroem as estruturas fundantes da violação das normas jurídicas infracionais: tipicidade, antijuricidade e culpabilidade.

Logo, a ação humana é elemento edificador das infrações e, como tal, deve ser analisada sob a perspectiva da subjetividade.

vii. Considerações finais.

As linhas que se seguiram neste escrito, obviamente, estão longe do esgotamento da matéria. Entretanto, elas se prestam ao objetivo de chamar a atenção dos leitores acerca da necessidade da produção de outros artigos sobre o subfaturamento e a subvaloração, dada a sua importância e relevância no contexto do comércio exterior.

É com tristeza que vivenciamos o fato de as autoridades aduaneiras brasileiras desconsiderarem as regras previstas no Acordo de Valoração Aduaneira. Com isso, tomam para si a forma pela qual será indicado o valor aduaneiro praticado nas operações de importação.

Por não concordar com essa prática aduaneira, é que se coloca aos julgo dos leitores o presente artigo.

Ad. Cláudio Augusto Gonçalves Pereira

Abril 2.022

 

Sócio fundador da Reis Gonçalves Associados. Advogado. Especialista em Direito Processual Civil pelo Centro de Extensão de Universitária. Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP/SP. Mestre em Filosofia do Direito e do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Doutorando em Direito Constitucional Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. Professor convidado do curso de pós-graduação do Direito Aduaneiro da Universidade do Vale de Itajaí – UNIVALI. Professor do curso de pós-graduação de Direito Aduaneiro da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL. Conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF (2011-2016). Conselheiro do Conselho Municipal de Tributos da Prefeitura do Município de São Paulo (2006-2016). Autor de diversos artigos jurídicos e Coordenador da Obra Coletiva: Ensaios de Direito Aduaneiro

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo apresentar aos leitores algumas considerações sobre as diferenças conceituais entre o subfaturamento e a subvaloração no comércio exterior, tendo em vista que as autoridades aduaneiras brasileiras têm desconsiderado as regras constantes do Acordo de Valoração Aduaneira.

 

PALAVRAS-CHAVE: Valoração Aduaneira. Subfaturamento. Subvaloração. Direito Aduaneiro.

 

ABSTRACT: This article aims to present to the readers some considerations on the conceptual differences between mis-invoicing and undervaluation in foreign trade, considering that Brazilian customs authorities have disregarded the rules contained in the Customs Valuation Agreement.

KEYWORDS: Customs Valuation. Mis-invoincing. Undervaluation. Customs Law.


[1] Conforme Solon Sehn: “Para garantir a efetividade dos efeitos fiscal e, sobretudo, extrafiscal do imposto de importação, a legislação estabelece regras de valoração aduaneira dos bens. Estas constituem mecanismos de controle de manipulação artificial da base de cálculo, notadamente nos casos de vinculação entre o importador e o exportador, presentes na maior parte das operações de comércio exterior.” In: Regime de incidência do Imposto de Importação. In: DOMINGO, Luiz Roberto; SARTORI, Angela; PEIXOTO, Marcelo Magalhães. (coord). “Tributação Aduaneira à luz da Jurisprudência do Carf – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais”. São Paulo: MP ed, 2013, p. 302.

[2] Sobre o tema: SEHN, Solon. Regime de incidência do Imposto de Importação. In: DOMINGO, Luiz Roberto; SARTORI, Angela; PEIXOTO, Marcelo Magalhães. (coord). “Tributação Aduaneira à luz da Jurisprudência do Carf – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais”. São Paulo: MP ed, 2013, p. 301-309.

[3] Cf. ALENCAR, Luciano Bushatsky Andrade de. “Subfaturamento e Subvaloração na Importação”. Curitiba: Juruá, 2019. p. 33. “O mais relevante princípio do AVA é o da primazia do valor da transação, que prevê a utilização do valor de transação definido pelo artigo primeiro do Acordo. Este princípio visa a preservação do valor declarado na fatura comercial apresentada no curso do despacho aduaneiro de importação. Esse princípio determina que seja observado o preço efetivamente pago, ou a pagar, pelo importador das mercadorias, sempre que possível. Esse valor não será declarado, mas sim aquele obtido a partir das regras previstas no primeiro método de valoração aduaneira, a seguir delineadas.”

[4] Sobre o tema: FERNANDES, Rodrigo Mineiro. Valoração Aduaneira. In: DOMINGO, Luiz Roberto; SARTORI, Angela; PEIXOTO, Marcelo Magalhães. (coord). “Tributação Aduaneira à luz da Jurisprudência do Carf – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais”. São Paulo: MP ed, 2013, p. 251.

[5] Opinião consultiva 10.1, do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira da OMA. Tratamento aplicável aos documentos fraudulentos. O Acordo obriga que as administrações aduaneiras levem em conta documentos fraudulentos? Segundo o Acordo, as mercadorias importadas devem ser valoradas com base nos elementos de fato reais. Portanto, qualquer documentação que proporcione informações inexatas sobre esses elementos estaria em contradição com as intenções do Acordo. Cabe observar, a este respeito, que o Artigo 17 do Acordo e o parágrafo 6 do Anexo III enfatizam o direito das administrações aduaneiras de comprovar a veracidade ou a exatidão de qualquer informação de qualquer informação aduaneira. Consequentemente, não se pode exigir que uma administração leve em conta uma documentação fraudulenta. Ademais, quando uma documentação for comprovada fraudulenta, após a determinação do valor aduaneiro, a invalidação desse valor dependerá da legislação nacional.”

[6] Conforme Acórdão CSRF/03-04.743, de 20/02/2006: VALOR ADUANEIRO. SUBFATURAMENTO. A rejeição, pelo fisco, do primeiro método para a apuração do Valor Aduaneiro – Valor da Transação -, deve ser precedida do devido processo legal investigatório, conforme estabelecido no art. 1º, do Acordo Sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral Sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT). O subfaturamento é infração que não admite presunção, havendo que ser comprovado e claramente demonstrado. Precedentes do Terceiro Conselho de Contribuintes. Nulidade do auto de infração. Recurso especial negado.

[7] SEHN, Solon.  Imposto de importação. São Paulo: Noeses, 2016. p.161.

[8] SEHN, Solon. Comentários ao regulamento aduaneiro: infrações e penalidades. São Paulo: Aduaneiras, 2019. p. 157/158.

[9] ALENCAR, Luciano Bushatsky Andrade de. “Subfaturamento e Subvaloração na Importação”. Curitiba: Juruá, 2019. p. 70.